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Artigo: Análise e repercussão da 1ª etapa da proposta de reforma tributária

Por Eduardo Lemos Alves Saraiva

Em 21 de julho de 2020 foi enviada ao Congresso Nacional a primeira fase da proposta de reforma tributária do governo federal. Sendo uma das principais promessas de governo no tocante à economia, o projeto sinaliza a tentativa de simplificação da estrutura tributária brasileira.

Nesta primeira fase, a proposta é de extinção do PIS/Confins – tributos voltados ao financiamento de programas de integração social e da seguridade social – e a criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com alíquota unificada de 12%. O objetivo é reduzir o nível de burocracia e os custos de empresas com a declaração e o recolhimento de tributos. O projeto viria como forma de complementar as duas propostas que já tramitam no Congresso, a PEC 45/2019 e a PEC 110/2019.

Dados apresentados pelo Ministério da Economia apontam a existência de uma exacerbada complexidade no que se refere à tributação do PIS/Cofins. Destacam principalmente a forma de tributação e as alíquotas aplicáveis, juntamente com os créditos gerados por operação. Em consequência, é alto o número de contestações sobre a aplicação desses tributos.

Ao defender sua proposta, o governo fez um levantamento da sobrecarga judicial e administrativa de processos que discutem matérias relativas ao PIS/Cofins. São cerca de 71 mil casos administrativos no âmbito da Receita Federal e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF). Isso representa cerca de 20% do total de processos nestes órgãos. Nas vias judiciais, representa 25% dos processos da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional junto ao STJ. O Supremo Tribunal Federal produziu 22 temas com repercussão geral atinentes ao PIS/Cofins, que travam o trâmite de mais de 10 mil processos em instâncias inferiores.

Ao propor a criação da CBS com alíquota unificada de 12%, o Governo Federal busca a simplificação do método de tributação por meio da cobrança apenas sobre o valor agregado do produto ou serviço comercializado. Dessa forma, a CBS incidirá somente sobre a receita bruta obtida, e não sobre todas as receitas observadas na cadeia produtiva. Essa inovação simplifica, ainda, o crédito obtido em cada etapa da produção.

Entre os destaques do modelo pretendido pela equipe econômica do governo, podemos citar a redução de campos de preenchimento de notas fiscais (de 52 para 9) e a redução de 70% de obrigações acessórias. Também é destaque a não tributação via CBS das receitas não operacionais (dividendos, rendimentos de aplicações financeiras e juros sobre capital próprio).

Importante destacar que a criação da CBS não altera os regimes do Simples Nacional, Agrícola e Monofásico.

A isenção da CBS é prevista na venda de imóveis residenciais para pessoas físicas; na Zona Franca de Manaus; nas receitas decorrentes da prestação de serviços de transporte público coletivo; e nas operações entre cooperativas e seus associados. Há ainda a previsão de manutenção da alíquota atual para entidades financeiras, vedando a apropriação ou geração de créditos de CBS por estas.

CRÍTICAS

A proposta inicial de reforma tributária está sendo alvo de muitas divergências entre tributaristas de todo o país. A necessidade de reforma, apesar de ser quase unânime, diverge no sentido das medidas a serem adotadas. Foram apresentadas críticas ao modelo proposto pelo Ministério da Economia.

Muitos tributaristas avaliam que o modelo apresentado não resolveria efetivamente a complexidade tributária. E que, à primeira vista, serviria mais para descomplicar problemas operacionais enfrentados pelo Governo Federal e órgãos da administração.

O projeto também foi considerado “tímido” ao versar apenas sobre o PIS/Cofins. A proposta de unificação não é inovadora: já havia sido apresentada em momentos anteriores.

Outra crítica é sobre a fragmentação da proposta, feita em etapas. Esta forma prejudica a análise e evidencia críticas que poderiam ser mitigadas, caso o projeto fosse apresentado integralmente.

Entretanto, o fator de maior descontentamento foi em relação ao aumento da carga tributária para o setor de serviços. A maioria dessas empresas possui poucos insumos para a obtenção de créditos. Hoje as alíquotas aplicadas no setor são normalmente de 3,65% na sistemática cumulativa, e 9,25% na sistemática não-cumulativa; já a CBS terá alíquota de 12%. Esse aumento na tributação diverge do ideal de redução da carga tributária pregado pela equipe econômica do governo.

NECESSIDADE DE MUDANÇA

É notória a necessidade de uma reforma do, extremamente complexo, sistema tributário nacional. O enorme emaranhado de normas e direcionamentos jurisprudenciais acerca dos tributos atualmente praticados são fatores que dificultam a atividade empresária e, consequentemente, o desenvolvimento econômico do país. De igual forma, obstrui a atividade da administração e de órgãos judiciais.

É verdade que a simples unificação do PIS/Cofins numa única contribuição incidente sobre bens e serviços com alíquota diferenciada parece ser uma singela mudança que não resolve o problema da complexidade tributária brasileira. Acontece que, conforme anteriormente dito, a proposta apresentada trata apenas de uma primeira etapa. O governo já anunciou que nas próximas fases da reforma irá mirar na simplificação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), na reforma do Imposto de Renda para pessoas físicas e jurídicas, e na desoneração da folha de salários.

Assim, por mais que não se vislumbre de pronto todos os elementos e especificações da reforma tributária, a iniciativa de tratativas com o envio de uma proposta pelo Governo Federal e a existência de Propostas de Emendas Constitucionais evidencia o viés reformista que se faz necessário para que haja uma profunda reforma.

Ainda mais importante que a redução da carga tributária é a simplificação desta, medida essencial para que se possa adentrar na carga tributária propriamente dita. Nesse sentido, vê-se com bons olhos o atual cenário de reforma, percebendo-se, ainda, a quase unanimidade quanto à necessidade de simplificação do sistema tributário e o anseio geral pela maior transparência e facilidade no tocante à desobstrução deste.

*Eduardo Lemos Alves Saraiva é advogado (UFPE) no escritório Leite & Emerenciano Advogados; pós-graduando em Direito Tributário (IBET). Email: eduardosaraiva@leadvogados.adv.br